


Um torpor
2022
56 x 60 cm
Tinta acrílica sobre papel
Os olhos se abrem num choque
Sopro de vida que escorre pela boca
Que horas são? Que dia é hoje?
Passado e presente se encarregam de alinharem
Dançam na mente abraçados enquanto os olhos ardem secos
O corpo dói
Os músculos parecem que carregam uma casa toda
As pernas ainda imóveis, mas agora já há um tremor
Um temor
Um torpor
O assédio é tão violento como o despertar
A boca fica seca, os olhos ardem, a coluna parece que feita de chiclete
'Você já pode se vestir'
Você já pode se levantar
E ir por esta porta afora
Não há de esquecer de se lavar e se maquiar o melhor sorriso que o resto do dia há de borrar
Um dois dez anos
Com o tempo, a areia nos olhos de conjuntivite vira catarata
Há que lavar los de dentro para fora, do centro a ponta, massageando em círculos com movimentos suaves
Da janela se ouvem os pássaros, os carros, e as gentes
A vida segue nas sombras das bocas e potes hermeticamente cerrados
E com os dias, de moles ficam duras não só as almas, mas as maçãs e as peles
Um dois dez anos mais
São requeridos para enfim pôr fim ao enrijecimento das preces de menina mulher marcada pela vida de outra vida não tão empática
A rotina então, trata de tragar a dor das costas como choquinho de fisioterapia
Ainda resta beleza e desejo de amar
Então ama-se
Amasse o nó que guarda na garganta e engula com café as memórias de um dois dez anos atrás e viva como rio
Flui-a no decorrer do percurso e aprecie a vista com olhos que ardem menos, mas seguem abertos de choque