Preciso começar dizendo que não tenho lá uma boa memória. Principalmente pros eventos da minha infância.
Existe, por exemplo, uma história de que eu e minhas primas participamos de um curso de teatro numas férias que eu tenho certeza que a família inteira inventa.
Agora descrevo uma memória muito viva que nasceu quando eu tinha uns cinco ou seis anos.
Era noite de Natal, mil novecentos e noventa e pouco. Santo André. Na época em que a gente sabia fazer festa.
Dezenas de pessoas na casa do meu tio Marco, irmão mais velho da minha mãe. Meus tios tinham um grande relógio na sala e já ia chegando a meia-noite.
Eu que já estava ficando é muito espertinha, vi que meu tio Marco desapareceu. E logo em seguida, ouvimos chegar o papai Noel. Ele entrou na sala, sentou numa cadeira, deu bala e presentes pra todas as crianças que tinham se comportado bem durante o ano. Eu inclusive, claro, que sempre fui muito bem comportada. Se levantou, e se foi. Afinal, são muitas as famílias pra visitar numa mesma noite. Quase como um sábado em São Paulo hoje.
Eu não podia acreditar. Já era muito incrível poder ver o papai Noel ao vivo, mais ainda era perceber que o papai Noel usava os mesmos sapatos do meu tio Marco. Que, aliás logo depois da saída do nosso visitante ilustre, voltou a aparecer pela sala. Que azar perder esse momento!
Foi aí que meu brinquedo-presente perdeu toda a minha atenção. Corri pra saia da minha mãe e disse. "Mãe, eu descobri uma coisa! O tio Marco é o papai Noel!"
Reparem que não descobri que o papai Noel era o tio Marco, mas sim que o tio Marco era o papai Noel.
"Ai! Não conta pra ninguém!" minha mãe disse.
Melhor noite da vida até então. Passei a olhar pro meu tio com muita mais admiração. Afinal, ele era maravilhoso. Ele era incrível. Era o papai Noel, em pessoa. Fantástico.
Talvez tenha sido nesse mesmo Natal que passei catapora pra todo mundo.
Algumas semanas atrás, comentei com a minha prima que lembrava quando tinha descoberto que o pai dela era o papai Noel.
"Quê? Mas meu pai nunca foi papai Noel."
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Comentei então com meu outro tio. "Tio, o tio Marco chegou a ser papai Noel alguma vez?" "Puts Má, não lembro." Me disse que normalmente era meu avô, mas que teve um ano que foi meu padrinho.
Às vezes sinto que minha cabeça me confunde de propósito. Pra fazer dos meus sonhos confusos mais realistas.
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